O milagre do pão
Na minha família pão é sinônimo de benção. Seja pelo catolicismo, que nos ensinou a receber o pão como corpo de Cristo, assim como por tudo que essa relação representa para nós: fartura, partilha e união. Minha avó sempre me disse que uma casa com pão é uma casa abençoada. Esses dizeres ecoam até hoje em minha memória. E, com isso, criei um dos meus maiores encantamentos e prazeres na cozinha, o de fazer o próprio pão.
Foi com ela que aprendi todos os passos e me vi, desde pequena, moldando pequenos pãezinhos naquela enorme mesa de madeira. Ali, ouvi sobre o processo de fermentação e os diferentes tipos de fermentos naturais que ela já fez. Outrora, ela contava sobre os tempos de dificuldade na família e como farinha, água e fermento se tornavam um verdadeiro alento. Também me contou sobre as melhores formas de rechear, cortar e assar diferentes pães. Mas nada se compara ao sublime momento de colocar literalmente a mão na massa.
Parecia uma cozinha mágica, com flocos de farinha no ar, a esponja de massa crescendo e o pão tomando forma. Nesse cenário de encantamento, minha avó esbanjava maestria e carinho, me ensinando cuidadosamente cada etapa da receita. Ingredientes na mesa e começavam os ensinamentos sobre a importância de sovar e “acordar” a massa. Também recebia lições sobre respeitar o tempo de crescimento de cada preparo. Então, era chegado o momento de levar os pães para o forno e o de ver minha avó cochichar com os tabuleiros. Não entendia essa parte, até que ela me chamou e ensinou aquilo que resume perfeitamente o ato de se fazer pão: “É preciso abençoar os pães, para que cresçam e assem com qualidade, mas que se tornem um alimento para todos”. Um breve silêncio se fez na cozinha encantada e aquele ensinamento me marcou por toda a vida.
Tempo de forno passado e começam a surgir vários pães quentinhos. Doce, salgado, recheado, comprido, bolinha e de várias outras formas. O cheiro atrai rapidamente filhos e netos para a mesa, afinal dia de pão é dia de festa. Contudo, preciso contar da principal receita dela, que certamente faz parte da memória de muita gente. Era um pão recheado com frango e legumes picados bem pequenos, misturados à massa de forma perfeita e com formato retangular. Nunca encontrei sabor parecido em lugar algum e, muito menos, amor igual em forma de pão.
Recolher cada bago do trigo
Forjar no trigo o milagre do pão
E se fartar de pão
Comentários